Quero falar de algo em mim que permanece intacto.
E quando encontro essa coisa, essa fumaça, essa confusão luminosa e quente que habita meu peito, sou de novo um corpo infantil e atento.
Disso que permanece intacto, embora ferido, tenho me ocupado. Tenho dedicado as comidas e bebidas e também todas as manhãs possíveis.
Não entrego a ninguém, nem àqueles pertencentes ao mais alto escalão dos meus amores, esta coisa só minha, esta coisa menina-velha que carrego.
Mas não foi sempre assim. Já coloquei a minha coisa intacta em mesas de aposta, já entreguei a agiotas afetivos, já sucumbi a falsos cofres e, o pior, já ofereci como uma iguaria rara, esta coisa intacta, porém ferida, a pessoas que mastigaram como se farinha fosse. Uma pressa de comer o fogo. Tão rápido, tão fútil, tão atrapalhado, que deu tempo de recuperar um pedacinho caído da afobação e guardar de volta num hospital íntimo, na espera do ressuscitar-orquídea ou rabo da lagartixa.
Pois brotou! De si. Do pedacinho de si, a coisa intacta, brotou.
Está quieta agora. Esse corpinho, ou recém nascido ou muito velho, tanto faz. Esse corpinho minúsculo. Está intacta e não entrego a mais ninguém. É minha, só minha, esta coisa intacta, porém ferida.