Estou precisando falar de amenidades.
E acho engraçado que eu, quando falo amenidades, pense em coisas como saudades ou amor, por exemplo. Como se fossem essas as amenidades. Imagino que a gente banalize o que percorre nossos dias com perenidade. Como um rio que sempre esteve e que só é possível voltar a olhar para ele quando tiver passado o tempo de raios. Preocupada com as urgências catastróficas, foquei na construção do meu bunker.
Eu comecei a colocar a cabeça pra fora esses dias. E olhar de novo para o rio que, generoso, não seca mesmo que eu não cuide tanto dele.
Cansei de ter medo e cansei de odiar pessoas. Cansei do sarcasmo ao qual espero não ter aderido, mas que certamente me percorre como um idioma possível para absurdos inexplicáveis pela coerência básica.
Quero olhar de novo para as pessoas e acionar, agora com certa tranquilidade, a empatia. Quero escrever sobre o amor. Quero fomentar uma alegria serena. Ou dar contorno para as tristezas humanas. Quero falar da comida preferida e do cheiro da casa de criança. Quero falar do desenho que fiz quando tinha oito anos e de como estamos conectados pela manifestação da nossa infinita ingenuidade perante os mistérios da vida.
Em algum lugar do meu bunker, onde me guardei de tanta atrocidade e me alimentei de um ar já gasto e cansado, sei que guardei uma chave frágil. Não de um cofre, mas aquela do diário secreto protegido por um cadeado de plástico.
Quero abrir a cortina e as pálpebras, quero arrastar os sofás e respirar aberto, quero reorganizar os pulmões para travessias menos assustadoras.
(o texto é mais curto. pra dar tempo de você dar o play nessa música e fechar os olhos para ouvir)
InDica:
Claro, o álbum todo da Elis, Falso Brilhante, um dos nossos maiores tesouros nacionais.
Meu livro, Sede de me beber inteira, em audiobook, grátis via Spotify.